Carpinejar: “As pessoas perdem muito tempo nas redes sociais querendo provar que estão vivendo”; poeta estará em Maceió no próximo dia 1
Jornalista e poeta vai bater um papo com o público sobre “Liberdade, melancolia e dor em um mundo em mutação”.
Janaina Ribeiro - Repórter
O jornalista e escritor gaúcho Fabrício Carpinejar estará em Maceió, no próximo dia 1 de novembro, para participar do ciclo de conferências Diálogos Contemporâneos. No encontro com o público ele vai falar sobre “Liberdade, melancolia e dor em um mundo em mutação” e, claro, as redes sociais estão super contextualizadas dentro desse tema. Para o poeta, as pessoas andam bem mais preocupadas com o seus avatares criados no universo digital e estão deixando de viver a realidade.
Carpinejar, na ocasião, também vai lançar o seu mais novo livro: Depois é nunca, que fala sobre dor, saudade e luto. Na sua 48ª obra, o escritor ressalta que a ninguém é dado o direito de desvalorizar o sofrimento do outro.
E o Maceió40Graus bateu um papo com Fabrício Carpinejar. Confira, abaixo, como foi essa entrevista.
1.Vamos começar com uma curiosidade: os seus sobrenomes têm Carpi, da sua mãe, e Nejar, do Carlos, seu pai. De onde surgiu a ideia de juntar os dois e formar o Carpinejar?
Meus pais são da área do Direito, são escritores, então, quando eu decidi unir os dois sobrenomes, quis fazer uma homenagem as histórias de vida e profissional de cada um. Eu não queria usar apenas um sobrenome e deixar o outro de lado, sabe? Foi uma saída diplomática que encontrei (risos), passando a fazer uma referência igualitária aos dois. E foi assim que eu passei a assinar Fabrício Carpinejar.
2. Você tem 48 obras publicadas, entre poesias, crônicas, textos infanto-juvenis e reportagens. É bastante coisa publicada. Há algum estilo literário que mais te agrada?
Isso vai muito mais do momento da história do que do meu momento, do momento que estou vivendo. Há livros que nascem para o público infanto-juvenil, há outros para poesias e, outros, para memórias reflexivas ou crônicas. Quando me vem a linguagem, eu já consigo saber qual será o gênero apropriado para ela. Eu jamais vou criar ciuminho entre os gêneros (risos).
3. O Carpinejar conquistou 20 prêmios literários, certo? Algum que teve um gostinho mais especial quando você foi agraciado com ele?
Olha, o Prêmio Associação Paulista dos Críticos de Arte pelo meu livro infanto-juvenil Filhote de cruz credo. Pra falar a verdade, essa conquista foi uma grande vingança literária em razão de todo o bullying que eu sofri na infância. Eu tive que lidar a vida toda com a minha estranheza, se bem que, hoje eu estou excêntrico, e isso foi uma promoção, né? Ninguém mais me chama de feio, agora o nome para isso é esquisito (risos). Só para você ter uma ideia, meus apelidos já foram Morcego, Fred Krueger, Jason, e por aí vai.
4. Os seus guardanapos digitais se tornaram um sucesso na internet. Como isso começou? Você retira as frases dos seus poemas e crônicas, por exemplo?
O guardanapo é algo que a gente usa e joga fora. Então, quando me surgiu um poema e eu estava sem papel, usei um guardanapo para escrever. Depois, percebi que joguei fora e fui atrás dele para salvar a poesia. A partir daí, veio-me ideia de criar esse movimento fazendo uma metáfora com o descarte das emoções. Quantas pessoas já se sentiram usadas e, depois, jogadas fora? Eu mesmo já me senti assim. Então, a ideia de escrever as frases no guardanapo é para que elas lutem contra o esquecimento. Minha intenção é despertar a resiliência nas pessoas através de palavras escritas num guardanapo. Ah! E eles são reais, tá? Eu escrevo de verdade.
5. Você é jornalista e, nos tempos atuais em que vivemos, tem acompanhado os constantes ataques à imprensa feitos pelo governo federal. Como você avalia esse tratamento dispensado aos profissionais da comunicação?
Eu acho que esses ataques ocorrem de forma premeditada. Querem calar a imprensa e fortalecer a indústria da fake news. Há uma grande articulação para isso, um grande engodo à sociedade. E essa retaliação acontece em função do papel da imprensa de proteger a informação, de assegurar a verdade. E a forma de reagirmos é não nos calarmos. Não podemos nos sentir amordaçados. Não vivemos mais o tempo de censura. Sigamos atuando como um antivírus contra as mentiras e a manipulação e fazendo com o que a população tenha acesso, sempre, a todas as versões de um fato.
6. A pandemia dá sinais de que está a caminho do fim e, com isso, os eventos voltaram. Qual é sensação de estar novamente lidando o público bem de perto?
Estamos vivendo uma sensação de reestreia. É uma ansiedade que logo se transforma em entusiasmo, capricho e, por fim, numa troca de gentilezas. Sei o quanto todo mundo sofreu em todas as áreas, houve muitas perdas, mortes, demissões. Todos nós vivemos meses bem difíceis, trágicos, então, a arte ela é curativa, ela alfabetiza a dor, e foi isso que ela fez com as pessoas durante esse período. E, claro, continuará sendo mais do que nunca com essa fase de retomada das atividades. E se alguém, neste momento, sai da sua casa para ouvir um autor que gosta é porque ela está precisando de tradução dos seus sentimentos.
7. No projeto “Diálogos Contemporâneos”, em Maceió, nesta próxima segunda-feira (1), você vai falar sobre “Liberdade, melancolia e dor em um mundo em mutação”. As redes sociais, imagino eu, com certeza estarão dentro desse contexto. Dá pra adiantar um pouquinho pra gente sobre o que o público pode esperar desse bate-papo?
As pessoas perdem muito tempo querendo provar que estão vivendo pelas redes sociais. E aí, elas não sabem mais comemorar a vida sem registros, no modo offline. A realidade se pôs esvaziada porque a humanidade está dedicando mais tempo ao avatar. Os indivíduos também têm se preocupado bem mais com o que estão comentando a respeito do seu relacionamento do que com o que realmente pensa e sente a sua companhia. É uma preguiça presencial tão grande e um excesso de virtualidade que eu, de fato, não consigo compreender.
8. E vai ter livro novo à disposição dos fãs, né? “Depois é nunca” fala sobre sentimentos, saudade, luto. Qual é a mensagem que você quer passar com essa obra?
Que a gente não pode, jamais, desvalorizar o sofrimento do outro, de quem perde um ente querido. É preciso se viver o luto, seja ele de natureza for. Não se faz gincana para saber quem sofre mais ou menos. Temos que dar trégua ao sofrimento para que ele ocorra e nos faça curar. Cada dor é particular e tem uma geografia pessoal. Então, o livro fala sobre isso.
9. Mudando um pouquinho de assunto… Você como gaúcho deve estar na expectativa para o julgamento dos réus envolvidos na tragédia da boate Kiss, previsto para ocorrer no próximo dia 1 de dezembro. Lembro-me que você já escreveu sobre isso em vários momentos. O que o Carpinejar espera desse júri? Conhecia alguma vítima ou familiares?
O episódio da Kiss foi uma matança sem precedentes. Foram 242 mortes. E, infelizmente, já estamos há quase nove anos sem responsabilizar os culpados. A bem da verdade, a gente não tem ideia do que deve sentir os familiares que perderam alguém que amava. Eu não tinha amigos que morreram, mas, também sinto dor por todas aquelas vítimas e me solidarizo com cada um que sofre e chora até hoje. E, apesar de não ter conhecido aquelas pessoas, sei que algumas eram minhas leitoras, então, de algum modo, eu estou ligado a elas. Portanto, o julgamento vai mostrar que agora não seremos mais omissos. Sem falar que todas as falhas na estrutura da Kiss mudaram a forma de se fazer segurança numa casa noturna.
10. E, para terminarmos, vamos convidar os alagoanos para o bate-papo contigo?
Claro! E o primeiro motivo para não perder esse momento é que estaremos reunidos num dos lugares mais lindos de Maceió, o centenário teatro Teodoro, numa roda de diálogos completamente gratuita. É de graça, gente! Vamos conversar e debater muito, será um espetáculo de pensamento e, posso garantir a vocês que não tem como não se emocionar. E ainda teremos interação com perguntas e respostas e, ao final, sessão de autógrafo. Vão lá, estarei esperando por todos para falarmos sobre saúde emocional . Estão todos convidados!
Serviço:
Projeto Diálogos Contemporâneos
Fabrício Carpinejar e o tema: “Liberdade, melancolia e dor em um mundo em mutação”
1 de novembro, no teatro Deodoro, às 19h
Entrada gratuita.